segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Chuva de verão

Estou castigado pela espera.

No verão tudo repete.
Tudo parece derreter.




domingo, 20 de outubro de 2013

Rota

Eu assopro.
Você morde.


Estávamos distantes um do outro apesar de caminhar na mesma estrada. Chão seco de terra batida e o vento que anunciava o fim da tarde balançava as árvores do caminho. Outono tudo indicava. Eu tentava rimar meus passos com os dele, ele não percebeu. Andava rápido como quem quisesse bagunçar minha meta. Era pressa.

Estávamos mais próximos. Eu comentei sobre uma árvore. Ele riu. Esqueci a parte ruim do caminho no sorriso. Chamei perto. "Não segura minha mão, podem ver!". Só havia nós dois no caminho.

Emburreci, esqueci o sorriso. Queria ele mais perto, trocar o suor das mãos, dizer com os dedos que o amava. Passou um moço. "Viu só!" - Ele disse. Vi e me aquietei.

Andávamos um ao lado do outro e pedi desculpas. Ele balançou a cabeça. Achei que não havia ouvido. Eu disse que o desculpava. Ele quis saber o "por quê".

Anoitecia. Eu disse que estava com medo do escuro. Ele me mandou continuar andando. Abaixei a cabeça. Eu sabia que ele tinha mais razão que meu medo ou dor nas pernas.

Cai. Escureceu mais em mim que o caminho. Ele correu em minha direção. "Você está bem?" - Ele perguntou. Não consegui responder. Fiz gesto de abraço. Ele me abraçou. 

Andávamos um ao lado do outro. Eu carregava sua mochila. Estavamos longe de onde íamos. Apenas era preciso andar. Eu não tinha certeza se eu era boa companhia. Ele não demonstrava esse medo. Meu medo crescia.

Ele me olhou. Sorriu. Eu soltei uma lágrima.

Segurou minha mão e disse "Continua!".

Eu mordo.
Você assopra.


Ao homem que me descomplica, mas me ama complicado.

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Nada

A iminência do sorriso lhe fez sorrir. Tinha nela o passo apressado e costas arriadas, tinha nela todos os sonhos e medos do mundo. Era completa em cacos. Se fazia difícil e padecia aos poucos. Chegou! "Eu sou a próxima da fila, onde estão meus diplomas, onde está o certificado, onde estão?"; "PRÓXIMO!". Andou. Na mesa branca encardida com manchas espaças de fundo de copo derramou seus documentos. "Eu me tornei esse bando de papéis." - Disse entre risos. A mulher não riu. Apenas observava fria o cabelo mal arrumado da menina. Das meninas. De todas que se faziam em mim o que fui por alguns segundos.

"Levantei. Fiz alguns pontos. Meus méritos se traduziram em pontos na mesa encardida de copos sujos espaçados." Ela, eu narrador, você leitor, e todos nós, somos ela. 

A porta rangeu quando a menina saiu. Todos olharam. Vestia saia e tênis, era misturada. Tinha cheiro de perfume forte, como quem não costuma usar perfume.

Foi andando, abriu o carro. Ligou o rádio e pela primeira vez respirou naquela manhã.

Amanhã é sexta. Não se dá mais aos luxos da cerveja. Na atual circunstância todas são caras. Tudo é caro.

Eu sugiro. Não sugira. Ela agora voltava rápido para casa. Tinha pressa em chegar para completar o seu não fazer. Tinha nela a fúria de chegar e concluir o que não havia começado. A falta de rotina ganhara força maior que a própria. Precisava no nada ver seu valor. Preenchia o vazio com mais vazio para se sentir saciada.

Era nada!

Estudou quatro anos, contava cinco pelos estágios não concluídos. Estava só. Abraçada ao diploma. Não tinha nada. Os amigos? "Como está, novidades? E aquela cerveja?"

De que valia. Não tinha ganhos na venda.

A menina tinha passos tortos. A iminência do sorriso. A curvatura já cansada. Os objetivos entrelaçados.
A menina era tu, era eu, era nada.