Eu não escrevi aqui no último ano. Olhar o passado é perder a linha que liga o agora a qualquer coisa. As músicas conseguem me dar esse fiapo de contato com o que passou, mas é sempre frágil e curto. Uma pena.
Nestes dias as consequências das minhas últimas decisões estão mais evidentes do que nunca. Apesar de o objetivo da mudança estar concluído, o "próximo passo" me assusta. Medo sobre medo.
Entrar na casa das pessoas procurando aconchego tem me tirado as energias. É tudo frio. Cansativo visitar lugares perguntado se é ali que eu quero viver, tanta responsabilidade. E ainda tem o preço.
A venda do carro não gerou dinheiro suficiente para uma vida despreocupada. É só uma micro segurança neste período. Um olhar para frente sem ver tão bem o que vem vindo. Uma névoa.
Vou ser mais dedicado à isto aqui.
recor te abs t r ato
domingo, 21 de janeiro de 2018
quarta-feira, 23 de novembro de 2016
10 Dias
1. Eu acordo com o seu barulho. Você insiste em arrumar o
armário, acho estranho, te dou “bom dia”.
2. Eu acordo com o seu barulho. Você tá com a mesma roupa de
ontem, não dormiu?
3. Eu acordo com o seu barulho. Você arruma o armário. “Quer
comer alguma coisa?”, você responde que não com a cabeça e encara as
prateleiras.
4. Eu acordo com o seu barulho. “Você precisa dormir um
pouco, amanhã arruma esse armário”. Eu acordo com o seu barulho.
5. Eu acordo com o seu barulho. “Por que você tá chorando?”
6. Eu acordo com o seu barulho. “Feliz aniversário!”. Você
coça a cabeça e reclama alguma coisa inaudível.
7. Eu acordo com o seu barulho. “Você ainda não comeu esse bolo?”
8. Eu acordo com o seu barulho. Você me encara com o pote do
remédio na mão.
9. Eu acordo com o seu barulho. ”O que você tá fazendo? Não
faz isso.”
10. Eu acordo.
quinta-feira, 17 de novembro de 2016
Céu
São Paulo, 2016. (35mm) |
Rafael anunciou-se filho da compaixão. Não com os outros, com ele mesmo. Parou de achar, na maior parte do tempo, que sua vida era o resumo do que ele sempre detestou.
Viver com os fones pendurados no ouvido foi a solução dos problemas, quase todos.
Passou, depois o incidente com as cordas, a usar a varanda para olhar o céu. Encolhido como os vasos de planta. Tão marrom quanto.
quarta-feira, 16 de novembro de 2016
Cordas
São Paulo, 2016. (35mm) |
Três cordas passavam na varanda de Rafael. Uma delas servia pra puxar o balde lá de baixo com as coisas que a vizinha gorda cozinhava e insistia em dar a ele. Outra segurava o varal no lugar, mas ele nunca lavava roupas. A terceira Rafael pendurou esta tarde.
16:45 o alarme do celular ecoou na varanda, Rafael deitado no chão abriu os olhos, não tinha calculado certo, arrebentou onde? Começou a investigar arrastando sua falta de talento para a morte. Não encontrou a razão.
Rafael evitou a rua por alguns dias, o que pensaria a vizinha gorda de baixo se o visse com o pescoço roxo. A falta comida foi o único motivo de alcançar a rua.
Saiu do prédio olhou para a sua própria varanda pensando a sujeira que faria se o pulo substituísse a corda. Pelo menos teria conseguido.
"Tá muito calor pra esse cachecol Rafael" - Disse o rapaz que vendia cigarros na calçada da frente. "Eu sei" - Foi a reposta seca por trás do cachecol.
No mercado encarou a sessão de queijos por alguns minutos. Voltou para os pães.
E na varanda, agora só duas.
sexta-feira, 9 de setembro de 2016
Portas
As portas do armário estão abertas, nada sai.
O vazio sentado ao seu lado aparenta ser maior que você. Estou silêncio.
Você procura na mochila as desculpas que me deve. Acha nada. Sua mochila não é capaz de renunciar por você.
Te tiro os olhos, um mosquito. Sem reparar a fuga, te acho.
Você diz que precisa ir. Onde?
As chaves, onde? Faço aceno com a metade da mão, o vazio te segue. Se vejo o vazio ele também é meu?
Sete passos, apago a luz do quarto olhando as portas abertas.
Amanhã escrevo sobre isso. Amanhã acordo cedo. Amanhã, vou.
O vazio sentado ao seu lado aparenta ser maior que você. Estou silêncio.
Você procura na mochila as desculpas que me deve. Acha nada. Sua mochila não é capaz de renunciar por você.
Te tiro os olhos, um mosquito. Sem reparar a fuga, te acho.
Você diz que precisa ir. Onde?
As chaves, onde? Faço aceno com a metade da mão, o vazio te segue. Se vejo o vazio ele também é meu?
Sete passos, apago a luz do quarto olhando as portas abertas.
Amanhã escrevo sobre isso. Amanhã acordo cedo. Amanhã, vou.
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